domingo, 7 de novembro de 2010

O QUE É VERDADEIRAMENTE INDIGNO E ILEGAL?


Este artigo é uma resposta do jornalista e escritor francês, Michel Collon, aos comentários de Pascal Bruckner, Bertrand Delanoë, Alain Finkielkraut, Bernard-Henri Lévy, Yvan Attal, Pierre Arditi, Michel Boujenah, Patrick Bruel e outros, no Jornal francês Le Monde

«O boicote a Israel é uma arma indigna», escreveram vocês, na edição de segunda- feira (01/11) no Le Monde. Com uma certeza assombrosa, afirmam que “a justiça francesa não tardará em confirmar a ilegalidade do boicote”. Segundo vocês, todos os que querem ajudar assim os palestinos a obterem seus direitos, estariam fora da lei. E para isso argumentam que: “Não se pode aplicar um tratamento deste à democracia de Israel.”

Como podem chamar de “democrático” um estado que foi construído com a violência, expulsando os palestinos de suas casas e de suas terras em 1948? Um estado que sempre teve a limpeza étnica entre seus planos:
«Devemos expulsar os árabes e ocupar seu lugar” (David Ben Gorem, 1937).

«Entre nós, deve ficar claro que neste país não há lugar para dois povos. A única coisa que se pode fazer é transferir todos os árabes daqui para os países vizinhos. Não deve sobrar nenhuma pessoa, nem uma tribo.» (Joseph Weitz, 1940.

«Os palestinos nunca existiram» (Golda Meir, 1969).

«Cada um de nós devemos nos apoderar de todas as colinas que pudermos para ampliar as colônias, porque tudo que tomarmos, agora, será nosso...” (Ariel Sharon, 1998).

Como podem chamar de “democrático” um estado que rechaça o retorno das pessoas que expulsou e segue roubando sistematicamente de suas terras, enquanto finge que negocia? Sejamos claros:um estado colonial, baseado no roubo de terras e na expulsão do povo nativo, nunca será uma democracia. Embora tenha um parlamento, embora os ladrões discutam democraticamente entre eles sobre a melhor maneira de roubar, segue sendo um estado de ladrões que se impõe pela força.

O boicote é ilegal?
Em absoluto, já que sua finalidade é fazer com que as leis sejam respeitadas. Ter expulsado os palestinos de seu país, em 1948 e negar seu legítimo direito de retorno a seus lares é um desrespeito às leis i internacionais, afirma a ONU. Conquistar mais territórios pela força é ilegal. Impedir que os palestinos vivam em suas terras, trabalhem, estudem ou circulem é ilegal. Destruir suas casas e suas oliveiras é ilegal. Encarcerar crianças de doze anos é ilegal. Construir um muro de separação, roubar a água e as terras dos territórios ocupados é ilegal. Utilizar armas de fósforo e laser é ilegal. Bombardear casas, escolas, hospitais, ambulâncias e prédios da ONU é ilegal. Torturar é ilegal. Assassinar dirigentes palestinos é ilegal. Matar defensores da paz em águas internacionais é ilegal.

Frente a essas ilegalidades, o que faz a ministra francesa da justiça? Pede que sancione o estado que comete essas ilegalidades? Impede a importação pela França de produtos procedentes dessas terras roubadas? Não. Ela ataca quem denuncia esses crimes.E vocês apóiam essa ministra que zomba do direito internacional. Assombroso!
Vocês escrevem: «Somos firmemente contrários ao boicote porque somos partidários da paz». Mas o Boicote já existe!Há mais de sessenta anos, Israel boicota os palestinos e vocês não fazem nada contra isso. Dado que os dirigentes israelenses atuam segundo a relação de forças, o boicote é uma arma perfeitamente digna para impor a paz. Como o foi contra o apartheid na África do Sul.

Vocês escreveram: “Uma coisa é a critica, outra é o rechaço, a negação e, em definitivo, a deslegitimação”. Mas Israel, há mais de 60 anos, vem rechaçando, negando e deslegitimizando os palestinos. Isso não causa indignação em vocês?
Vocês escreveram que: «Ceder ao chamamento ao boicote equivale dizer que já não se pode mais negociar». Isso não é correto. A solução existe; é muito simples, como acaba de recordar o músico Gilda Atzmon: « Os israelenses podem acabar com o conflito num abrir e fechar de olhos. Amanhã, pela manhã, ao levantar-se, Netanyahu devolve aos palestinos as terras que lhes pertencem».

É pedir muito? Em 1968, as organizações palestinas fizeram grandes concessões ao propor que se formasse um só Estado democrático, progressista, laico, onde judeus, cristãos e mulçumanos poderiam viver em paz, desfrutando dos mesmos direitos. Foi Israel que se negou e segue negando. É Israel que se aferra à sua obsessão de um estado etnicamente puro, reservado aos judeus. Por que vocês não assinam grandes chamamentos contra isso?

É pedir muito? Os palestinos têm aceitado, inclusive, conformar-se com 22% de seu território original, mas Israel também rechaça esta proposta e segue roubando mais terras, pouco a pouco; e vocês não fazem nada contra isso.

Definitivamente, não é o Boicote que é indigno! É a atitude de vocês que é indigna. Porque tudo o que acabo de escrever, sabem vocês muito bem. Ao ocultar tudo isso da opinião pública, vocês estão contribuindo para a desinformação. Que interesses estão ocultos por trás dessa atitude?

Suspeito que verdadeiramente indigno, em seus escritos, são suas motivações. Em meu livro, “Israel: vamos falar sobre isso?” assinalo que os três grupos midiático mais poderosos da França - Lagardère, Dassault e Bouygues - estão em mãos de famílias riquíssimas que fazem grandes negócios com Israel e lhe fornecem armas e demais instrumentos para a colonização. De modo que se um artista ou intelectual francês criticar esses grupos e ousar dizer a verdade, terá que dizer adeus à sua carreira, à sua fortuna! Como dizia Bertolt Brecht: « Aborrecer os possuidores é renunciar às posses».

Quem lê seus artigos e publicações, quem escuta seus argumentos, deveria se fazer esta pergunta fundamental: “Que interesses se escondem por trás dessas abordagens?”

* Fontes das citações: Michel Collon, Israël, parlons-en!, Couleur Livres, Investig’Action, Bruselas, 2009, pp. 297-299.

Fuente: michelcollon.info